Esta semana participei da Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família, na Câmara dos Deputados, com o objetivo de apresentar parte da visão conservadora no tocante à garantia dos direitos à liberdade de religião, expressão e consciência, argumentando o motivo pelo qual nós, conservadores, somos contrários à equiparação da união homossexual ao casamento.
Considerando que não foi possível apresentar meus argumentos com total clareza devido ao pouco tempo, mas principalmente por causa da reação intolerante de alguns presentes, infelizmente ligados à militância LGBT+, com relação à minha pessoa, decidi publicar aqui, nesta coluna, um resumo do que pretendi apresentar.
Um dos motivos mais contundentes pelos quais acredito que o casamento constitucional, segundo os moldes da família entendida à luz das ciências biológicas e da ortodoxia cristã, não deve ser equiparado às uniões homossexuais, diz respeito à criação dos filhos, além da capacidade de reprodução humana.
Sabemos que dois homossexuais não são capazes de perpetuar a própria espécie, o que os torna logicamente dependentes da adoção de filhos gerados por pessoas que mantiveram relações sexuais heterossexuais.
Isto, por si só, vejo como um contrassenso, pois se a união homossexual deve ser vista como equiparável ao casamento tradicional, feito entre homem e mulher, a capacidade de procriação também deveria ser um componente intrínseco a esse tipo de relação, mas não é, justamente porque essa incapacidade é fruto da realidade biológica dos sexos, onde apenas macho e fêmea produzem filhos, partindo deles a nossa formação e herança familiar.
Funções materna e paterna
Quanto à criação dos filhos, o que precisamos entender, também, é que a identidade humana é formada a partir de referenciais, sendo as figuras do homem e da mulher, ou seja, pai e mãe, as maiores responsáveis e, portanto, cruciais para esse desenvolvimento em sociedade.
É muito difícil falar sobre isso em um contexto de tanto enviesamento ideológico nas ciências humanas, algo que infelizmente vem se refletindo até mesmo em estudos ditos "científicos", mas cujos resultados são modelados para atender uma demanda de militância político-ideológica, e não da realidade humana baseada nos fatos.
Em face disso, deposito o meu entendimento na experiência da vida comum, onde a criação de filhos por parte de pai e mãe, adotivos ou não, segue o que já praticamos há milênios, desde os primórdios da humanidade, sendo o tempo e a formação da civilização humana como é hoje, constituída por famílias que se reproduzem por conta própria, os nossos maiores fundamentos e motivo pelo qual continuamos existindo como espécie.
Mas, também deposito o que acredito no entendimento de grandes teóricos do desenvolvimento infantil, como Donald Woods Winnicott. Para ele, a união do pai com a mãe, cada qual exercendo diferentes papeis, é o que permite a criança desenvolver a sua maturidade cognitiva para lidar com o mundo.
Ao interpretar um dos textos de Winnicott, por exemplo, a psicanalista Corinne Boukobza diz que a "presença real do pai é indispensável para permitir e, ao mesmo tempo, limitar a fantasmatização edípica da criança", o que vale para meninos e meninas.
Em um artigo de revisão publicado em 2004, a doutora Edyleine Bellini Peroni Benczik afirma que "as teorias psicológicas e as pesquisas científicas afirmam e fundamentam o papel da figura paterna no desenvolvimento e no psiquismo infantil", sendo isso um "pressuposto da teoria psicanalítica o papel estruturante do pai, a partir da instauração do complexo de Édipo".
Citando também um estudo feito por Mariana Eizirik e David Simon Bergmann, a Dra. Benczik ressalta que ambos fizeram "uma rigorosa revisão da literatura, relacionada à importância da figura paterna na vida dos filhos", onde foi apontado que "a ausência paterna tem potencial para gerar conflitos no desenvolvimento psicológico e cognitivo da criança, bem como influenciar o desenvolvimento de distúrbios de comportamento."
Contra-argumentos
Os conceitos que destaquei também se aplicam sobre a figura materna, porém, sobre outros aspectos do desenvolvimento. As citações que fiz são apenas um pequeno recorte, a título de exemplo, do que teóricos renomados, bem como autores nacionais e internacionais entendem sobre o assunto.
Muitos, atualmente, argumentam que as figuras paterna e materna são apenas símbolos que podem ser interpretados pela criança de acordo com o papel desempenhado por cada integrante da família, o que não impediria, em tese, que uma das pessoas numa relação homossexual pudesse desenvolver a função de mãe ou pai, ou mesmo terceiros como avós e tios.
Particularmente, e com fundamento na literatura disponível, entendo que tanto a paternidade quanto a maternidade não são apenas funções sociais, estando reduzidos ao simbolismo cultural. Antes disso, são também definições biológicas que começam pela diferenciação dos sexos macho e fêmea.
Os papeis que ambos exercem na família, homem e mulher, foram/são gerados em decorrência das diferenças sexuais, em nível biológico, sendo isso modelado por diferentes hormônios e condições físicas específicas no corpo do macho e da fêmea, algo que duas pessoas do mesmo sexo podem até simular, mas não substituir – biogeneticamente.
Conclusão
Com isso, portanto, entendo que a união homossexual não deve ser equiparada ao conceito traduzido em nossa Constituição, onde o ente familiar é composto apenas por homem e mulher, porque isso envolve a própria capacidade de reprodução, sendo essa uma característica indissociável da instituição matrimonial tradicional.
O casamento civil homossexual, bem como o reconhecimento da união estável, por outro lado, são conquistas da comunidade LGBTQIA+ originadas de decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2011 e 2013, respectivamente.
Sobre esses direitos, uma vez adquiridos, não há o que voltar atrás. A comunidade LGBTQIA+, portanto, continuará podendo estabelecer união civil e obter as garantias do Estado, como os direitos à herança e partilha de bens, por exemplo.
O que diz respeito a nós, cristãos e conservadores, não é a retirada de direitos adquiridos, mas a distinção do casamento tradicional, conforme está na Constituição, do casamento civil homoafetivo. É algo necessário, pois envolve questões que podem invadir a esfera da liberdade religiosa, sendo essa uma das nossas grandes preocupações.
Como podemos ver, o assunto é complexo e exige seriedade. Como disse durante a minha fala na Comissão, repito aqui: me coloco à disposição da comunidade para debater com honestidade intelectual o assunto, considerando que os Direitos Humanos é para todos, não só para uma minoria, e que cabe a cada um de nós lutar pelo bem comum, incluindo àqueles que divergem de nós. Esse é o meu entendimento.
Marisa Lobo é psicóloga, especialista em Direitos Humanos, presidente do movimento Pró-Mulher e autora dos livros "Por que as pessoas Mentem?", "A Ideologia de Gênero na Educação" e "Famílias em Perigo".
* O conteúdo do texto acima é de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.
Leia o artigo anterior: Setembro Amarelo: precisamos falar dos pastores que cuidam, mas não são cuidados
mundo gospel