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Negação do Saci no Brasil revela cultura racista, dizem pesquisadores

Mensagem em inglês convidando para a festa de Halloween nas escolas não é uma cena de filme estrangeiro, mas de possíveis cenários de escolas brasileiras em 2023.


Brasília - Pesquisadores falam sobre Dia do Saci, comemorado nesta nesta terça-feira, 31 de outubro - Foto Joédson Alves/Agência Brasil

Neide explica que a lenda não está revestida de maldade. "O Saci tem uma atribuição. É o guardião da flora e da fauna. Ele precisa ser apresentado aos estudantes como aquele que preserva a vida", diz a professora. O Saci, então, representa a nossa ancestralidade, identidade e valores.

"É aquele que transgride e questiona. Ele busca a liberdade para todos os oprimidos". A imagem do Saci com uma perna também poderia ser utilizada para inclusão, no entender da professora. "Opõe-se a qualquer Halloween da vida, que não tem nada a ver com a gente".

Duas pernas

Também pesquisador do tema, o professor de arte Edmar Galiza contextualiza que o Saci Pererê nasceu na mitologia dos indígenas Guarani, na metade do século 18. "Era uma figura que tinha duas pernas. Ele vivia nas matas para protegê-las dos caçadores, saqueadores e destruidores da floresta. O Saci é uma das figuras mais reconhecidas e importantes do folclore brasileiro", afirma.

Mesmo assim, e com a evolução da legislação, o país não foi capaz de alterar o racismo impregnado. Para o professor, que faz doutorado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), no estudo da construção da educação antirracista e decolonial, é "muito difícil" a escola estar fora do lugar social em que vivemos. "A escola pode trazer mudanças, mas não sozinha. O racismo está em todas as nossas instituições, por isso falamos em "racismo estrutural", pois permeia nossas instituições cotidianamente". Essa lógica ajuda a entender que a marginalização da nossa cultura afro, indígena e híbrida atua em prol da valorização da cultura europeia e estadunidense. "As nossas referências vão sendo cada vez mais importadas".

Sincretismo

O pesquisador Edmar Galiza sugere, inclusive, que uma possibilidade de o tema ser trabalhado em sala de aula é lembrar a origem da lenda e como a figura do Saci foi se transfomando. "Trazer o tema para a sala de aula, para aumentar o universo cultural e artístico dos e das estudantes, mostrando a nossa cultura, nosso folclore, nossas histórias e lendas", exemplifica.

Brasília - Dia do Saci é comemorado nesta terça-feira, 31 de outubro. Pesquisadores falam sobre o tema - Foto Joédson Alves/Agência Brasil

Para a professora Neide Rafael, é necessário recordar que a lenda está ligada à liberdade e à democracia do ser, que guarda elementos do sincretismo cultural brasileiro. "O cachimbo e a fumaça vêm com os indígenas. E o mito negro e africano são da maior importância. Ele é energia, um encantado, um orixá dentro das religiões de matriz africana".

Os pesquisadores entendem que a construção feita pelo escritor Monteiro Lobato sobre o Saci distorceu a lenda. "Essa figura do menino negro de uma perna só passa principalmente pela recriação do personagem (no Sítio do Picapau Amarelo)", diz o professor Edmar Galiza.

O saci de Monteiro Lobato colocaria, na avaliação de Neide, a lenda de "maneira pejorativa". "O Saci é guardião, é energia, liberdade mental que todo ser humano tem , principalmente, uma criança precisa ter", diz. Para ela, é necessário valorizar as raízes que fazem com que as crianças brinquem de amarelinha ou trava-línguas.

O Saci no palco

O Saci inspirou a companhia de teatro Andaime, do Distrito Federal, a recuperar o espírito da lenda. Em um espetáculo elaborado quando estavam em Portugal, "O Saci é uma Peça", os artistas criaram uma história em que a lenda brasileira invadia o palco da Chapeuzinho Vermelho.

A atriz Tatiana Bittar explica que o trabalho é encenado em escolas e também em espaços abertos, como parques. "É uma peça cheia de brasilidades. Nós temos em comum sermos alimentados pela mitologia brasileira".

Na peça do grupo, o Saci desmonta a história da Chapeuzinho. A montagem já completou dez anos desde que foi criada. Além da peça, a companhia criou um disco para contar a mesma história, mas adaptada à linguagem radiofônica.

Brasília - Dia do Saci é comemorado nesta terça-feira, 31 de outubro. Pesquisadores falam sobre o personagem - Foto Joédson Alves/Agência Brasil

O Saci dança também no embalo da híbrida Banda BaianaSystem, de Feira de Santana (BA). "Esse é outro aspecto importante em relação ao Saci: as recriações da figura e do significado dele", diz o professor Edmar Galiza. Uma mistura de reggae com guitarra e ritmos afro-brasileiros em uma releitura de nossa lenda em alto e bom som: ""O Saci Pererê vai dançar numa perna só/ Quem tá só, fica junto, quem tá junto, fica só".

Galeria Saci Pererê - Joédson Alves/Agência Brasil

Agencia Brasil

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