Nayib Bukele, presidente de El Salvador, pode até ser desconhecido para alguns. Mas, a cada dia, tem se tornado um líder popular que faz brilhar os olhos da direita e até da esquerda na América Latina, tornando-se uma referência para alguns candidatos. Segundo uma pesquisa divulgada pela ONG Directorio Legislativo, ele ocupa a primeira posição do ranking de presidentes dos países latino-americanos mais bem avaliados, com 90% de aprovação. Os dados levam em consideração pesquisas de imagem e índices de aprovação presidencial e governamental em 18 países da região, conduzidos por um grupo de aproximadamente 100 empresas de consultoria e centros de pesquisa. No começo do mês, o partido governista de El Salvador aprovou, em meio a um debate sobre se a Constituição proíbe ou não um segundo mandato consecutivo, a candidatura do presidente Nayib Bukele para as eleições, marcadas para ao dia 4 de fevereiro de 2024.
“Nuevas Ideas torna oficial que o vencedor da candidatura presidencial para a República de El Salvador é o senhor Nayib Armando Bukele Ortez”, anunciou Karen González, presidente da Comissão Eleitoral do NI. Apesar de ainda faltar alguns meses para a votação, a vitória de Bukele já é quase certa. Ou, como diz David Morales, professor de relações internacionais da Universidade Federal do ABC, ele não vai buscar a reeleição, e sim o segundo mandato. “Ele já está eleito, o que ele quer é o segundo mandato, só que, para isso, ele vai ter que mudar a Constituição e ele tem todo o apoio, já conseguiu a maioria absoluta no Congresso e no Judiciário também”, explica. A guerra do chefe de Estado às gangues rendeu ao líder 90% de aprovação da população, apesar de uma boa parte criticar seus métodos para combater a criminalidade.
Bukele, de 42 anos, anunciou em setembro de 2022 a decisão de buscar a reeleição, depois que o Supremo Tribunal de Justiça emitiu uma resolução que permite a reeleição presidencial, uma decisão que gerou polêmica sobre a legalidade da medida. A Constituição salvadorenha estabelece que não pode concorrer à presidência quem tiver “exercido o cargo por mais de seis meses, consecutivos ou não, no período imediatamente anterior, ou nos últimos seis meses anteriores ao início do mandato presidencial”. Para Morales, Bukele é um estrategista que está flertando com o autoritarismo devido à possibilidade de adquirir tamanho poder. “Ou, por que não, um totalitário, que seria mais perigoso quando se tem acesso total a toda a rede íntima do cidadão”.
Christopher Mendonça, cientista politico e professor de relações internacionais do Ibmec Belo Horizonte, destaca que Bukele é um líder com bastante maleabilidade — só assim é possível atingir os números que ele conquistou. O professor relembra que o salvadorenho, que hoje se apresente como outsider, ou seja, não representa nem a esquerda, nem a direita e se diz contra o sistema, iniciou sua carreira do lado canhoto, mas foi sendo prejudicado pelo partido e migrou para grupos mais conservadores. Contudo, seus discursos não acenam para um lado. “Fora do país, ele chama a atenção de grupos de direita, como a família Bolsonaro. É um presidente muito midiático, um dos líderes mais seguidos no TikTok, o que permite uma proximidade dele com a população e pessoas fora do país. E agrade aos dois polos, de esquerda e direita”. As pesquisas mostram que nove em cada dez salvadorenhos aprovam a gestão de Bukele, que devolveu a segurança às ruas com sua “guerra” declarada às gangues criminosas em março do ano passado.
A cruzada contra esses grupos criminosos se sustenta por um regime de exceção, cuja última prorrogação (a 15ª) foi aprovada pelo Congresso em meados de junho. Sob essa medida, cerca de 70 mil supostos membros de facções criminosas foram presos. As medidas adotadas por Bukele para combater a criminalidade é defendida por parcela expressiva da sociedade, porém criticada por alguns setores, principalmente por organizações e líderes internacionais que o acusam de violar os direitos humanos e se tornar um ditador. O Congresso de El Salvador aprovou uma prorrogação por 30 dias de um regime de exceção com o qual o presidente Nayib Bukele sustenta uma “guerra” contra as violentas gangues que assolam o país centro-americano. Uma medida que, entre outras coisas, permite detenções sem ordem judicial. Os governistas sustentam que ela é uma resposta a uma escalada de homicídios, com o pico de 87 mortos entre 25 e 27 de março de 2022.
@nayibbukelePara las siguientes elecciones, redujimos el número de diputados y eliminamos los "residuos". Ahora, todos los votos valdrán lo mismo. For the next elections, we will reduce the size of Congress and eliminate the seats won by "residue". Now all votes will be worth the same.♬ original sound – Nayib Bukele
“A questão da segurança é algo importante em El Salvador, que enfrenta há anos o problema das gangues. Isso gera insegurança na população. A segurança pública é um fator de instabilidade desde a guerra civil. Bukele se apoiou na pauta que ele sabe que é importante para o cidadão”, destaca Márcio Coimbra, coordenador de pós-graduação em relações institucionais e governamentais do Mackenzie. “Quando você tem um presidente que age nessa luta, explica a popularidade, mas isso não indica que ele vai se manter e que ele permaneça por muito tempo no poder. Sendo populista, abrimos possibilidade e chances de vermos uma guinada rápida para um governo autoritário e autocrata.” Há algumas semanas, por iniciativa do governo Bukele, o Congresso aprovou reformas para reduzir o número de deputados no Parlamento de 84 para 60, ao mesmo tempo em que diminuiu de 262 para 44 a quantidade municípios nos 14 departamentos do país. As duas medidas entrarão em vigor em maio do próximo ano.
Coimbra comenta essa decisão e fala que essa mudança é uma forma dele concentrar poder. “Se ele não tem uma difusão, diminui a oposição e tem maior controle. São características de um governo autoritário. Ele está mudando as estruturas do Estado. Diminuindo os municípios e criando regiões, consegue ter maior controle da situação sobre a população.” O professor Mendonça afirma que Bukele consegue ganhar a população porque demonstra que a diminuição das estruturas burocráticas traria benefícios orçamentários. “Quanto menos atores públicos, menos custo com as máquinas públicas. Esse discurso ganha a população, e a popularidade dele vai se elevando, pois reconhecem essa ação como uma passo positivo.” Para Coimbra, Bukele é mais um populista na América Latina, assim como outros que já fizeram seu nome. “A América Latina produz em série esse tipo de pessoa. O que vemos com ele foi a mesma coisa que vimos com outros líderes populistas. O populismo está entranhando na região, há uma paixão entre o povo e o populismo”.
De um dos países mais violentos e perigosos, El Salvador ficou 365 dias sem homicídios desde que ele iniciou seu mandato, em 2019. Estaria este jovem líder que chegou ao poder com 37 anos — hoje ele tem 42 — salvando seu país? Para o David Morales, professor de relações internacionais da Universidade Federal do ABC, as coisas não são bem assim. “Muitos falam que o Bukele está salvando El Salvador. Eu acho que não podemos afirmar que ele está salvando o país, que isso seria demais para uma gestão de uma prática de um governo muito recente”, diz. Morales ressalta que Bukele é mais um líder na América Latina que chega ao poder com seu carisma e com a promessa de mudanças e esperança.
@nayibbukeleCerramos el 10 de mayo de 2023, con 0 homicidios a nivel nacional. Con este, son 365 días sin homicidios, todo un año.♬ original sound – Nayib Bukele
Apesar de estar dando certo neste momento, a política de combate à criminalidade é uma medida paliativa, que a longo prazo não deve surtir o mesmo efeito. “O índice de criminalidade abaixou, mas o método é polêmico porque, claro, quem não tem controle a poderes no regime de decisão pode fazer e desfazer. Não sabemos até quando ele vai tirar esse regime de exceção.” Mendonça complementa dizendo que elevar a população carcerária não é a solução para combater a criminalidade. Além da questão dos direitos humanos, os custos são altos. “Manter o nível de encarceramento tão elevado como Bukele tem feito não vai se preservar por muito tempo diante das dificuldades logísticas e econômicas envolvidas no processo. Muito brevemente, ele deve se preocupar com a ressocialização desses prisioneiros.” Apesar desta crítica, o especialista avalia que o salvadorenho está fazendo um governo favorável e positivo até o momento, mas também ressalta que não são medidas eficientes a médio e longo prazo. “Ele vai ter que planejar uma nova forma de conduzir as políticas públicas do país para atingir os números de popularidade e efetividade que o governo dele tem mantido agora”, fala.
Bukele assumiu o poder para um mandato de cinco anos em 1º de junho de 2019. Naquele ano, o país registrou 38 homicídios por 100 mil habitantes, tendência que continuou em queda. O ano de 2022 terminou com 7,8 homicídios por 100 mil habitantes. O ministro da Justiça e Segurança, Gustavo Villatoro, disse que os dias sem homicídios são “um marco histórico” e que a tarefa iniciada em 2019 “não foi fácil, mas, tampouco, impossível”. No momento, não há estatísticas conhecidas de fontes independentes. A redução dos homicídios ocorre no marco de uma “guerra” que Bukele declarou aos grupos criminosos há 15 meses, amparado em um regime de exceção que soma cerca de 70 mil supostos integrantes de gangues detidos. O regime de exceção, que permite prisões sem mandado judicial, foi instituído em 27 de março de 2022, em resposta a uma escalada de homicídios por gangues que matou 87 pessoas de 25 a 27 de março de 2022. Criticado por diferentes organizações de defesa dos direitos humanos, o regime tem sido prorrogado mensalmente.
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