Ex-ministro do Meio Ambiente e autor de um dos requerimentos para instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Movimento dos Sem Terra (MST) na Câmara, Ricardo Salles (PL-SP) é o principal cotado para assumir a relatoria do colegiado, que pode responsabilizar autoridades – especialmente ligadas ao governo Lula 3 – por possível leniência com as invasões de terras no campo, incluindo os três terrenos da empresa Suzano Papel e Celulose, nos municípios de Teixeira de Freitas, Mucuri e Caravelas, no sul da Bahia. O requerimento para instalação da comissão foi lido pelo presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), na última quarta-feira, 26, e a expectativa era que o colegiado fosse instalado na próxima semana. No entanto, com a urgência para aprovação do PL das Fake News, a CPI deve ser formalmente instalada entre os dias 7 e 10 de maio. “Há um consenso entre as lideranças de que a pessoa no Congresso com mais condições para relatar sou eu. O deputado federal Tenente-Coronel Zucco também foi um dos autores e ficou com a presidência. Então, há um consenso e um apoio do presidente Lira para que eu seja relator”, afirmou Salles em entrevista ao site da Jovem Pan. O deputado diz que o colegiado não é “contra o governo Lula”, mas que busca principalmente colocar “ordem no campo” e apontar os financiadores por trás dos movimentos. Confira abaixo os principais trechos da entrevista:
O presidente Arthur Lira leu na quarta-feira, 26, o requerimento para a criação da CPI do MST. Quais as expectativas para a instalação? Formalmente, está tudo pronto. Meu sentimento, não conversei esse nível de detalhe com o Arthur, mas fiquei com a impressão de que em razão da prioridade que ele está dando para o PL das Fake News, ele vai deixar a instalação da CPI do MST para a outra semana. Porque as CPIs tirariam da prioridade o projeto de lei 2630 [número formal do PL das Fake News, relatado pelo deputado Orlando Silva].As invasões no campo não são novidade. Embora tenham diminuído no governo Bolsonaro, elas nunca deixaram de existir. Por que a instalação de uma comissão de investigação agora? Por algumas razões. Primeiro, porque aumentou de maneira brutal a quantidade de invasões. Somente nesses três meses de mandato do Lula foram mais invasões que em o ano de 2022 inteiro. Na velocidade que estão acontecendo, até junho, vamos ter mais invasões no primeiro semestre de 2023 do que os quatro anos do governo Bolsonaro. Isso é inacreditável. O segundo ponto é que, ao contrário dos quatro anos anteriores, de que os órgãos do governo não deram incentivo, apoio ou se omitiram, neste governo, os órgãos têm se omitido completamente. O terceiro motivo é que o governo Lula, embora alguns integrantes, para fazer média com os produtores rurais e classe média, tenham dito que condenam moralmente as invasões, essas afirmações se contrapõem às atitudes do Executivo. As atitudes do governo têm sido [no sentido] de incentivar e até prestigiar o pessoal envolvido nas invasões. O exemplo disso é a ida do João Pedro Stédile na comitiva oficial de Lula para a China. Veja a contradição entre dizer que condena, mas na verdade estimula. O último ponto é descobrirmos se o MST e a Frente Nacional de Luta conseguiram retomar o financiamento indireto dos grupos de invasão de propriedade através de acordos com o poder público.
O senhor é o principal nome para assumir a relatoria da CPI. Se confirmada a sua escolha para o cargo, qual linha defende? Estará confirmado quando o presidente Arthur Lira anunciar. Mas há um consenso entre as lideranças partidárias e também dos meus colegas deputados, de que a pessoa no Congresso Nacional do lado da oposição que mais tem condições, mais conhece o assunto, e reúne os principais requisitos para relatar isso, sou eu. Além de que fui um dos autores dos requerimentos que permitiram que a CPI avançasse. O deputado federal Tenente-Coronel Zucco (Republicanos-RS) é um dos autores e ficou com a presidência e eu com a relatoria. Então há um consenso e um apoio do presidente Lira para que eu seja relator. Dito isso, vamos ter que primeiro identificar as lideranças, para que elas possam ser responsabilizadas. Teremos que fazer também o rastreamento dos recursos, do dinheiro que é usado para financiar as invasões. Também é possível, com o ministro Paulo Teixeira, a construção de uma solução que ponha fim aos problemas do campo relativos à invasão de propriedades, invasão de terras indígenas, invasão de unidades de conservação, todos eles estão ligados à necessidade de termos o conceito da regulamentação fundiária definitivamente implementado no Brasil. Regulamentação fundiária está na espinha dorsal de todos esses problemas.
Podemos esperar uma convocação do João Pedro Stédile, líder do MST, na comissão? O que o senhor acha que ele deve explicar? Temos que convidar. Evidentemente, se a gente convidar o João Stédile, o João Pedro Rodrigues, o pessoal da Frente Nacional de Luta e eles vieram, a gente faz via convite. Não tem necessidade de enfrentamento e desgaste. Se não vierem, a gente faz via convocação.
O ministro Paulo Teixeira deu de ombros para a CPI do MST, sob a alegação de que não há fato determinado, já que o MST saiu das terras em Pernambuco. O que o senhor acha disso? É óbvio que tem fato determinado. Todas essas invasões, incluindo na Embrapa e Suzano, são fatos determinados. Tem data, tem dia, tem hora. À medida que as invasões aconteceram e elas têm responsabilidades para serem apuradas, o fato determinado permanece. A CPI não é medida de reintegração de posse.
Nas últimas semanas, temas polêmicos têm causado tumultos constrangedores na Câmara, especialmente em comissões, o que já irritou bastante o presidente Arthur Lira. Como evitar que a investigação vire um circo? Não vai virar tumulto porque o nosso objetivo não é transformar a CPI em um conflito. Claro que apurar a responsabilidade é nossa obrigação, identificar quem são os responsáveis pelos crimes cometidos, mas o tom principal do trabalho é encontrar soluções. Neste sentido, gostaria que o ministro Paulo Teixeira unisse esforços conosco e não fosse uma parte contrária. A CPI do MST não é contra o governo, é para colocar ordem no campo.
Retomando o que o senhor disse anteriormente, na próxima semana o plenário da Câmara vota o mérito do PL 2630, apelidado de “PL da Censura” pela oposição. Como o senhor avalia o projeto? É possível barrar a aprovação? O projeto original é inaceitável. A oposição fez uma série de ponderações que poderão ser eventualmente acolhidas pelo deputado Orlando Silva. Se ele acolher de maneira correta, podemos ajudar a aprovar. Se ele não acolher, temos votos – e a votação a urgência já demonstrou isso – suficientes para derrubar. Tem que tirar todas as punições e instrumentos de censura prévia. Concordamos com a identificação, saber quem são os usuários não tem problema nenhum, mas tem que manter o sigilo. Quem tem que saber é a plataforma, não tem que ser aberto ao público. Depois, o Ministério da Verdade que o governo queria criar, o Orlando Silva mexeu, mas ele colocou uma propositiva que transporta para o governo o direito de regulamentar o assunto. Quer dizer, ficou ainda pior. Essas mudanças vão tornar o “PL da Censura” inaceitável.
jovem pan