Quem tem por volta de 30 anos era apenas uma criança e não acompanhou a história de um dos maiores esquemas de corrupção de que se tem notícia.
Quem tem por volta de 30 anos era apenas uma criança e não acompanhou a história de um dos maiores esquemas de corrupção de que se tem notícia. Um período que parecia estar sepultado, mas que teima em flertar com o presente. Há quase duas décadas, no ano de 2005, o então presidente do PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) Roberto Jefferson ganhava os holofotes e estampava as manchetes de todos os veículos de comunicação do país. Com sua extraordinária capacidade oratória, encurralou seus oponentes e denunciou a bandalheira que ficou conhecida como mensalão.
A falcatrua envolvia o pagamento de propinas para compra de apoio parlamentar. O escândalo sem precedentes teve início quando um funcionário dos Correios foi flagrado recebendo propina, desencadeando a CPI dos Correios, que revelou um rumoroso caso de desvios de recursos públicos do país.
Jefferson usou toda a sua competência no domínio da palavra em público para fustigar a cúpula do PT (Partido dos Trabalhadores) e membros do governo, embora tenha poupado nas suas críticas o chefe do Executivo. Seus veementes pronunciamentos atingiram em cheio a máquina de corrupção e deram origem a um capítulo de incertezas políticas. As investigações desses fatos mudaram os rumos do Brasil.
Agora, às vésperas desses acontecimentos completarem 20 anos, os Correios voltam aos noticiários, quase pelos mesmos motivos de 2005, prejuízos e má gestão. A estatal deu prejuízo de R$ 2 bilhões nos nove primeiros meses deste ano, após ter registrado um déficit de R$ 600 milhões em 2023. Essa repetição nos desmandos em empresas estatais instiga a reflexões sobre a incapacidade de evitar ciclos de má gestão e problemas estruturais que corroem empresas administradas pelo poder público no Brasil.
Roberto Jefferson novamente está às voltas com a justiça. Com condenação que deve superar nove anos de prisão pelo STF, o ex-líder petebista é acusado de crimes como calúnia, incitação à violência contra os Poderes e agressão a policiais. É uma grande ironia: o homem que denunciou um esquema que abalou o país e foi elogiado por isso, agora se encontra em desgraça, simbolizando as voltas que a história, especialmente a política, pode dar.
Nem o mais criativo ficcionista poderia elaborar uma narrativa com tantos episódios coincidentes. Na verdade, os fatos estão além de simples coincidências, eles são reflexos de como as instituições do nosso país não conseguem eliminar seus próprios fantasmas.
Em 2005, as denúncias de Jefferson provocaram uma profunda reflexão sobre ética e malfeitos. Hoje, os problemas permanecem, como um lembrete constante de que essas questões não foram solucionadas, e, ao que parece, correções apenas paliativas foram tomadas. Esse enredo também traz à tona a discussão sobre a relação entre liderança e responsabilidade.
Jefferson foi amplamente elogiado por sua oratória no passado, uma qualidade que o destacou em um momento crítico. Agora, essa mesma habilidade parece impotente diante dos erros que ele cometeu.
Analiso essa questão com propriedade, já que ele foi meu aluno no curso de oratória. Além de ajudá-lo a aprimorar sua comunicação, convivemos por um bom tempo em sala de aula, um espaço onde os disfarces desaparecem, dando lugar à autenticidade. Nas nossas conversas, observei seu idealismo e vontade em participar da construção de um país melhor.
O que vou dizer agora não o exime de culpa, nem serve como defesa, mas estou convencido da sua boa índole. Embora gostasse de mostrar armas e praticar exaustivamente tiro ao alvo seu senso de justiça e idealismo sempre o acompanharam. Com sua perícia e experiência jamais erraria os tiros se quisesse mesmo acertar. Mas quem vai julgar apenas as intenções?
Há pouco tempo escrevi uma carta a ele. Recordei os momentos de nossas aulas e mencionei os discursos eloquentes que proferiu, sempre encantando as plateias. Ele me respondeu que estava magrinho e deprimido, e só sobrevivia graças ao apoio incondicional da esposa. Que ele encontre força e coragem para enfrentar esse verdadeiro calvário.
Não importa o que aconteça, ele já está definitivamente gravado na nossa história. Jefferson, Bob para os íntimos, nos ajuda com um poderoso ensinamento: o Brasil aprendeu algo com o mensalão? Ou estamos condenados a reviver os mesmos problemas, ainda que em contextos diferentes?
As lições da história muitas vezes ficam ofuscadas pela urgência do presente, mas é importante revisitá-las para entender como quebrar ciclos de corrupção e má gestão. Siga pelo Instagram: @polito